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sexta-feira, 11 de novembro de 2011

A Sociedade do Chega Pra Lá... O_o

Amigos, neste dia repleto de significados esotéricos, numerológicos, matemáticos e outros, quis deixar uma reflexão social e altamente pessoal, que por acaso é coisa pouco habitual neste blog.

Sem muito preâmbulos, hoje quis falar da facilidade, da autêntica arte que está enraizada, desde tenra idade, na maioria de nós, a da desculpa fácil aos nossos defeitos, erros e responsabilidades. 

Talvez seja porque é uma questão ocidental, possivelmente mediterrânica, mas possivelmente mais transversal a "ene" civilizações do que gostaríamos de admitir, mas tenho dias em que me farto das esquivas, das permanentes tentativas de tanta gente para evitar o inevitável: assumir alguma coisa de que não se orgulhem.

Entre clientes distraídos, que nem olham para as cadernetas antes de as actualizar e metem uma página qualquer, jurando a pés juntos que algum ilícito tinha sido praticado nas suas contas, ou que a máquina se tinha enganado - clássica, esta última - passando por colegas que nunca desarrumam nada - presumindo-se portanto culpa do material, que como é rebelde se desarruma sozinho... - e terminando em amigos, familiares e conhecidos que se esquivam de assumir responsabilidade no actual estado de coisas do nosso país - possivelmente por amnésia, que a omissão de auxílio é crime... - é um desconsolo ver o estado de coisas a que se chegou.

Entre políticos que apontam o dedo a tudo menos a si próprios, a pais que culpam professores, sociedade, filmes e jogos de vídeo pelos filhos que andaram demasiado ocupados para criar, a países que deitam as culpas de erros recorrentes a gerações mortas e que levantam as mãos para os céus, num gesto de absoluta inocência, entre religiões que chutam p'ra canto ensinamentos pacíficos e só lêem o que lhes convém, e entre milhões mortos pela fome, pela doença e pela guerra todos os anos enquanto o mundo dito civilizado, de costas viradas, pergunta se será altura de se inscrever num ginásio...

E depois não podemos desprezar o valor da Comparação Relativista (adiante designada por CoRe), que tenta colocar em perspectiva erros grosseiros ou defeitos gravosos, à luz de situações que permitam pensar que a asneira de que se é acusado é pequena comparada com a de umas misteriosas "outras pessoas", dos infames "montes de malta" ou do famigerado grupo "toda a gente".

Dou-vos como exemplo um colega meu, super boa onda, altamente espiritual - como o bacalhau, mas mais corpóreo - que, teimosamente, apesar de ser altamente inteligente e ter uma memória prodigiosa para dados políticos e geográficos, insiste em fumar como se o mundo fosse, de facto, acabar em 2012 (coisa com que ele insiste ser verdade, em brincadeira naturalmente). Já o conheci a fumar meio maço por dia - o que para quem nunca viu um desses à frente, se traduz em 11 preguinhos de caixão - e a sentir-se excelente, mas a querer diminuir. Nessa altura, usando o tal esquema da CoRe, ele alegava que conhecia "outras pessoas" que fumavam um maço inteiro, ou mesmo mais!! 

A parte engraçada é que estou convencido que ele acreditava mesmo que isso queria dizer que ele tinha uns pulmões virgens, e não que se matava - ligeiramente - mais devagar, o que é completamente diferente. O poder da sugestão é, indubitavelmente, uma força poderosa :) 

Mas continuando, aí há um ano mudou para tabaco de enrolar, absolutamente convicto que este passo só traria vantagens - não só era muito mais barato que o processado pelas tabaqueiras e as suas margens gananciosas, como era mais saudável - por possuir menos aditivos, supostamente - e ainda - e esta era a "pièce-de-resistance", pelo tempo que demorava a fazer um cigarro, com mortalhas, filtros e perícia à mistura, passaria menos tempo a fumar (!) e começaria, gradualmente, a perder a vontade de o fazer pela trabalheira que dava...

Não foi preciso muito tempo para o meu amigo - e digo-o com todo o orgulho que isso implica, porque é de um muitíssimo bom amigo que se trata, um ser humano fantasticamente inteligente e altamente competente a incontáveis níveis, mas humano ainda assim - aparecesse no trabalho com uma maquineta que parecia um baton sobre-dimensionado, que permitia fazer cigarros de uma forma automatizada, com um mínimo de esforço e desperdício :)

O argumento na altura foi que andava a desperdiçar muito tempo (o que antes era bom) e tabaco muito caro (que outrora era muito barato) numa operação que devia ser prazerosa. E a parte gira das ilusões que criamos para nós mesmos, das gaiolas douradas em que nos encurralamos, é que tomam configurações de tal forma atractivas que simplesmente não admitem perspectivas divergentes, como aquelas esculturas de rostos em baixo relevo, que parecem seguir-nos onde quer que estejamos.

Enfim, escusado será dizer que por essa altura este amigo já não passava a horinha habitual sem fumar, tendo reduzido o seu compasso de espera em muitos minutos e aumentado o consumo em muitos preguinhos - lá se ia a estatística confortável...

Como cereja no topo do bolo, aqui há coisa de 2 meses descobriu uma maquineta, que pela similaridade à outra, deve ter sido a versão industrial da primeira, antes de miniaturizarem o aparelho - agora, manifestara orgulhoso, já podia fazer 3 cigarros ao mesmo tempo! Confrontado, por mim, como um possível sinal de aumento descontrolado do consumo, desdramatizou dizendo que este novo tabaco - sim, que ele compra uns quilos por mês, e de todas as marcas, não é esquisito - era de tal forma mais saudável que o anterior que ficava ela por ela - e assim se dá a tal volta de 360 graus à vida de um trintão :p

E é este homem que deslinda com admirável simplicidade conspirações políticas, estabelece paralelos notáveis e analogias sagazes, o ser pensante que eu conheço que mais facilmente mistura o paranormal com para-anormais que é o nosso dia-a-dia de cidadãos neste país de incoerências escabrosas, verdades escondidas e vergonhas perdidas - a prova provada que a inteligência não é antídoto para o auto-hipnotismo inconsciente.

Não há mês que passe sem que eu me olhe ao espelho e pense que era melhor estar sossegadinho, que as ondas moem pedras, mas têm muito mais força com o mar todo por detrás - e que uma voz solitária tem um poder quanto muito simbólico, se não for solista de um coro maior, ou parte de um colectivo coerente. 

Eu próprio crio desculpas diárias para procrastinar os meus sonhos, os meus objectivos antigos, resoluções para problemas novos e velhos, mas sei no meu âmago que tenho culpas no cartório, e que, independentemente das cartas que a vida me jogou, o meu destino faço-o eu - a cantilena de caminhos escritos por linhas tortas, de karmas milenares e outras teorias tipo palmadinha-nas-costas, servem o seu propósito de tala nos olhos até um ponto.

A partir de um determinado momento, ou tomamos as rédeas das coisas, ou elas tomam as nossas - e acreditem que sentir o cortar do chicote no lombo, o freio nos dentes e as forças a esgotarem-se sob um futuro inclemente é um destino pior que a morte.

Parar é morrer, e fingir que não erramos o suficiente para ter de mudar é pior que parar - é imaginar que corremos enquanto todos vêem que estamos imóveis, de olhar fixo no umbigo, um fiozinho de saliva a escorrer no canto dos lábios...

Não podemos deixar que o maior inimigo da nossa felicidade nos impeça de atingir todo o nosso potencial - e se esse inimigo for o nosso próprio orgulho desmesurado, será assim uma vítima tão importante a sacrificar no altar dos nosso sonhos?  

Feliz São Martinho, amigos e amigas, que esta noite vos traga iluminação e um caminho claro à vossa frente - mas atenção, se exageraram na água-pé, pode ser sinal que caíram na linha do comboio... :D